Esta é a quinta e última postagem da série Trabalho infantil: saiba o que é legal nessa história. Clique aqui para acessar os outros conteúdos.
Novos desafios contra o trabalho infantil: em busca dos sem-escola e a Lei de Aprendizagem
O resultado de ações como as do Ministério Público do Trabalho (MPT) e do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ao idealizarem e executarem iniciativas de combate ao trabalho infantil levaram o país a reduzir o número de crianças e adolescentes submetidas a atividades laborais.
O que merece comemoração, contudo, revela a necessidade de uma atuação ainda mais incisiva. Afinal, ainda são 2,7 milhões as vítimas do trabalho infantil no País, segundo os dados de 2015 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE (o órgão chegou a divulgar um decréscimo desse número para 1,8 milhão em 2016. Contudo, o número é controverso, já que houve uma mudança no critério de avaliação, e não incluíram as crianças e adolescentes que trabalham para o próprio consumo).
O desafio agora é buscar os jovens que trabalham mas não estudam e ampliar iniciativas profissionalizantes que estimulam atividades profissionais e não prejudicam o aprendizado na escola.
O procurador do trabalho Antonio de Oliveira Lima lembra que das 85 mil crianças e adolescentes que trabalham no Ceará, cerca de 20% não frequentam a escola. “Então, a gente estima 17 mil fora da escola. A busca deles é mais difícil ainda. Os que estão na escola é mais fácil, porque temos o endereço”, explica.
Assistência social
Mas a identificação desses jovens é apenas o começo. “Uma vez identificado, o que fazer com ele? Que tipo de atendimento essas crianças vão ter? Se é uma criança de 0 a 14 anos incompletos, temos que trabalhar a política da educação e da assistência a ela”, alerta. Ele também defende a atuação de serviços de convivência e fortalecimento de vínculos, “esse feito pela assistência social”, destaca.
Segundo o procurador, estes são serviços de atendimentos a crianças e adolescentes que envolvem atividades lúdicas de cidadania, de esporte, de cultura, e de estreitamento das relações familiares. “É um trabalho feito pelos educadores, sociais, contratados pelas secretarias de Assistência Social”, lembra.

Quantidade e qualidade
E aí reside mais um desafio. “O problema desse ponto é a quantidade e a qualidade. Muitos não foram identificados, e os que estão lá não tem um serviço de boa qualidade”. Lima alerta que onde há essas atividades, elas costumam ocorrer apenas dois ou três dias por semana, durante apenas duas horas. “E nos outros dias as crianças estão mais sujeitas às vulnerabilidades”, lamenta. “Também há a falta de qualificação do pessoal e de materiais. Não atrai a criança”, resume.
Some-se a esse problema estrutural, a falta de recursos, cada vez mais escassos. “De 2014 a 2018, 65 municípios do Ceará receberam um recurso adicional do MDS [Ministério do Desenvolvimento Social – agora Ministério da Cidadania) para combate ao trabalho infantil, mas essa verba acabou”, denuncia Lima. “Tem a dificuldade da quantidade de profissionais da assistência social para identificar as crianças. Estamos pedindo o apoio das escolas para isso”, acrescenta.

Aprendiz legal
Outra frente de batalha ainda a avançar é a da Lei da Aprendizagem, programa do governo federal previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que obriga qualquer empresa com pelos menos sete empregados a contratar e matricular aprendizes nos cursos de aprendizagem, numa porcentagem que varia de 5% a 15% do número de funcionários.
Podem ser contratados como aprendizes jovens de 14 a 24 anos, desde que estejam matriculados e frequentando a escola, salvo se já tiver concluído o ensino médio. O trabalho realizado por eles é devidamente acompanhado e visa a formação profissional, bem diferente dos riscos a que são submetidas as vítimas do trabalho infantil.
Contudo, a lei é pouco aplicada na prática. Se fosse, defende Antonio Lima, haveria uma significativa redução nas estatísticas do trabalho infantil.
Muitas empresas alegam não poder cumprir o percentual exigido por causa das características dos negócios, que envolvem atividades perigosas ou insalubres. A solução, vê o procurador, é utilizar a cota social, também prevista na legislação (Decreto 8.740, de 2016).
Através da cota social, a empresa contrata o aprendiz e cede os serviços dele para um órgão público ou uma Organização Não Governamental (ONG).. “Isso seria uma forma deles cumprirem a lei e construir a responsabilidade social”, defende Lima.
Atuação política
O MPT no Ceará tem atuado junto a deputados estaduais sensibilizando-os a propor uma alteração na lei de licitações do Estado para que as empresas contratadas pelo governo possam realizar tais contratações. “Seriam uns dois mil aprendizes, porque o Ceará tem cerca de 40 mil empregados terceirizados”, destaca Antonio Lima.
Segundo ele, 82% das 85 mil trabalhadores infantis do Estado estão na faixa etária entre 14 e 18 anos. “São quase 70 mil. Não resolve, mas ajudaria. Eles estão nessa estatística porque estão contratados de forma irregular. O aprendiz deve estar matriculado e tem proteção social. Ele deixaria a estatística do trabalho infantil”, ressalta.
Ele disse ainda que em 2018 foram contratados 17 mil aprendizes no Ceará. O número, afirma, representa apenas 63% das vagas que deveriam ser preenchidas, conforme a previsão legal. “Há ainda 10 mil vagas se todas as empresas cumprirem a cota”, destaca.
Comentários 2
Trabalho infantil: saiba o que é legal nessa história - Seu Direito | Seu Direito - Diário do Nordeste
16/08/2019 as 07:04[…] > Novos desafios: em busca dos sem-escola e a Lei de Aprendizagem […]
Antonio Ferreira
16/08/2019 as 17:21Parabéns pela sequência de matérias sobre trabalho infantil e duas soluções.
Att.
Antonio